domingo, 30 de agosto de 2015

Sadhana Forest - Um estilo de vida sustentável.

Bom dia pessoal!

Bom, o tempo voa não importa onde estejamos, e já fazem 3 semanas que estou na Índia! Incrível não é? Completaram-se também 4 meses de viagem, e a famosa "crise" desta época.

Funciona assim: ao redor dos 4 meses as coisas deixam de ser super novidade e bate a saudade de casa..... Isso aconteceu comigo. Senti uma saudade danada da minha casa, dos amigos, família, gatos, rotina, língua, comida...... do aconchego. Um dia foi tão forte que até caíram umas lagriminhas.

Sabendo que é uma fase comum e temporária, não me preocupei. Vivenciei-a e aceitei-a como veio... mas mesmo com esta crise, com a saudade, não senti vontade de voltar. Amo cada detalhe da minha viagem e só quero é mais!



Nestas duas últimas semanas estive voluntariando aqui na Índia, num lugar chamado Sadhana Forest, parte de Auroville.

Auroville foi criada em 1968 e é uma cidade universal, ou seja, está na Índia mas não é bem Índia. A idéia é que pessoas do mundo inteiro possam viver em paz e harmonia e união, independentemente de suas crenças, religiões, tendencias políticas ou nacionalidades. Tem uma população de mais de 2 mil pessoas, sendo que um terço é indiana (o que achei bem legal).


Auroville vista de cima, interessante!!!

Apesar da Sadhana fazer parte de Auroville, fica fora do centro da cidade, o que a torna bastante independente e com personalidade própria. O projeto Sadhana iniciou em 2003, quando Yorit e Aviran se tornaram responsáveis por 70 acres de terra, completamente árida e degradada. Seu objetivo: reflorestar esta área com a vegetação nativa (Tropical Dry Evergreen Forest).


Foto Google de uma área bem degradada. Sadhana era assim!

Por algum tempo tentaram, sem muito sucesso, plantar as mudas de árvore, que acabavam não vingando e morrendo. Perceberam então que a missão de reflorestamento seria impossível pois toda a chuva existente passava pela terra árida sem de fato penetra-la e aí começou um dos grandes pilares do projeto: conservação de águas.

Usando uma série de técnicas da permacultura foram capazes de, ao longo dos anos, aumentar em 6 metros o nível das águas dos lençóis subterrâneos. Isto favoreceu não só o projeto, com a possibilidade de crescimento das árvores plantadas, mas os vilarejos ao redor, que passaram a ter mais água para seu uso diário. Legal né?

Hoje a área está assim, com mais de 30 mil árvores plantadas, e uma taxa de sucesso de 85%! Orgulho de estar fazendo parte deste projeto.


Caminhos de Sadhana
A vida aqui é bastante simples, baseada em alguns princípios e bastante organização:

1 - Veganismo - Gente, sou vegetariana mas não vegan. Sempre achei que seria muito difícil ser vegan, afinal, o que eles comem? Mas a comida daqui é incrível, variada e diversificada, totalmente orgânica e saudável. São 3 refeições diárias maravilhosas. É super possível comer bem e ser vegan ao mesmo tempo.

E não é só na comida que o veganismo se baseia: nos comesticos e vestuários também. Assim usamos apenas produtos biodegradáveis, de baixo impacto no meio ambiente, e que não tenham sido feito, ou que não tenha sido usado nenhum componente animal em nenhuma etapa produtiva. Totalmente animal friendly!



Não sairei daqui vegan, mas repensarei alguns hábitos de consumo, e sei que, um dia, passarei do vegetarianismo para o veganismo. Faz todo o sentido.

2 - No competition - A ideia aqui é estimular o senso de comunidade, de união, e não a competição. Assim nenhum tipo de competição é bem vinda, nem mesmo nos jogos. É sempre estimulada a cooperação.

Adorei, e acho que de fato nossa sociedade se baseia muito na competição, na hierarquização, nos ganhadores X perdedores, e com isto apenas nos isolamos cada vez mais, diminuímos o senso de comunidade e participação.

3 - Humanity - Aqui é o mesmo princípio de Auroville: aceitar a todos como são. Sem comentários, super a favor.

4 - Substances free - enquanto permanecemos aqui, sem álcool ou tabaco ou qualquer tipo de droga. 100% saudáveis e lúcidos.

5 - Unscholing - É uma filosofia que defende o não envio das crianças para a escola para não serem " enquadradas" no sistema competitivo e massacrante, que não valoriza a identidade única ou a criatividade. Propõe que a criança aprenda através de métodos naturais e de acordo com sua própria curiosidade, cabendo a ela decidir o que quer estudar.



Achei estes um dos princípios mais controversos. Aqui conheci duas crianças que seguem este princípio, filhos dos fundadores. Uma menina de 14 anos, que neste ano decidiu ir pela primeira vez a escola, e sua irmã de 9 anos que nunca foi.

A menor, com quem tive mais contato,  é uma menina super ativa, que está aprendendo a tocar um instrumento musical, fala 3 línguas, é super articulada, conversa com você com mega desenvoltura, e agora está aprendendo muay thay. É uma fofa e super inteligente, mas não sabe ler ou escrever, pois nunca se interessou por isto.

Acho a idéia interessante, mas não tenho uma opinião formada sobre isto. Talvez eu já tenha sido "escolarizada" demais...


6 - Gift Economy - Aqui a idéia é a troca e doação de coisas e produtos que já não quer mais, assim, quem precisa deles pode usa-los. É uma redução de trocas monetárias e desperdícios. Em SP já tem diversas iniciativas deste tipo (como o site "tem açúcar?"), e acho super legal. Aqui funciona através de uma loja grátis, onde você pode pegar o que precisa (sapatos, roupas etc.) e deixar o que não precisa. Esta sendo muito útil para mim, que estou usando algumas das roupas de lá!


7 - E, claro, conservação de águas - Aqui tudo é feito e pensado para a maior economia possível de água e maximização de recursos.... tudo é economizado e reaproveitado.

As torneiras e banheiros são pensados para usar a menor quantidade de água possível, e nossa produção diária no toilete vira adubo!

Torneira para lavar as mãos: usa apenas 0,5 litros por minuto contra 7 litros da torneira convencional.


Benheiro: usa apenas 1 litro de água por dia contra 30 litros por descarga na privada convencional.
O banho é de balde e canequinha, também para econimizar a água, e toda a água usada é canalizada para irrigar as plantas ao redor. Tudo muito eficiente, e, mesmo concordando 100% com tudo, confesso que sinto saudades de uma privada convencional e uma boa ducha!

Aqui a gente realmente se sente parte de uma comunidade, uma experiência nova para quem, como eu, vem de uma cidade grande onde não conhecemos nem os nossos vizinhos. Tudo é feito em conjunto e para o bem comum. Está sendo uma experiência muito interessante e recomendo aos aventureiros de plantão vir conhecer e participar deste lugar.

Acho que tive um pouco de sorte também, pois a comunidade pode ter mais de 100 pessoas, mas, por alguma razão, durante minha estadia estava bem pequena, com umas 30 pessoas, assim era fácil achar um espaço vazio quando minha necessidade de privacidade falava mais alto. Não sei como eu teria me sentido se não conseguisse estar nunca sozinha....


Este é a nossa rotina diária. acordando as 5:30 da manha com alguém tocando violão, uma maneira bem gentil e melhor que despertador. As 6:00 nos reunimos no que eles chamam de Morning Circle, para alongamentos e abraços coletivos, e saímos energizados para a primeira parte do trabalho, que é na floresta.

Pode envolver plantar árvores, regar árvores, fertilizar o solo com compostos orgânicos, fazer trincheiras para preservação das águas e até mesmo a manutenção das estradas.

Abaixo uma sequência do trabalho de manutenção da estrada


Primeiro retirando a lama, depois preenchendo o buraco causado pelas chuvas com pedras e terra para, finalmente, ter a estrada prontinha para ser usada novamente










As vezes é cansativo, sempre é suado, mas é muito legal e gratificante :-)

A segunda Seva normalmente é dentro da comunidade e não na floresta. Pode ser cozinhar, limpar, cuidar do jardim, dos compostos orgânicos, dos banheiros naturais, dos painéis solares, das construções, ou qualquer outra coisa que a comunidade esteja precisando.

Cozinha depois de limpinha
Estação de lavar a louça. A limpeza é feita com cinzas (aproveitadas da lenha do fogão) .

Simples, gostoso e não muito cansativo. Estou amando!

Dormimos num dormitório coletivo (a menos que você seja um voluntário de longo prazo, que fica aqui por mais de 6 meses e aí tem um dormitório individual).

A rede é essencial aqui! Mosquitos vorazes hahahahaha
A noite temos uma programação especial. Nas segundas é dia de "sharing", e qualquer um pode compartilhar com o grupo o que quiser. É legal pois se conhece um pouco mais a história de cada um.

Nas terças temos sempre um eco-movie, um filme que fale sobre um dos princípios da Sadhana. Eu assisti TAP, que fala sobre o problema da água no mundo, e super recomendo (TAP THE MOVIE); The economics of Happines, que é muito interessante e me fez pensar sobre coisas de forma diferente (Trailer oficial do filme) e Maidentrip, um filme sobre Laura Dekker, uma garota que aos 15 anos partiu sozinha para uma viagem ao redor do mundo, em seu barco (e eu aqui, chamando a minha viagem de coragem hahahahahaha). Este filme é sobre unschooling e também é bem legal. Pode-se ver este documentário no netflix.

Nas quartas temos o open stage, onde quem tem algum talento pode se apresentar. Pode cantar, tocar música, dançar, recitar.... qualquer coisa

Son e Qing se apresentando

Galera escutando
Eu, com tantos talentos desenvolvidos, fiquei na dúvida sobre o que apresentar e acabei não apresentando nada hahahahahahahahahaha, mas a galera manda super bem e sempre é uma noite agradável.

Quinta é livre, não temos jantar, então normalmente vamos comer juntos em algum restaurante por perto.

Eba, a comida chegou!
Thali, prato típico daqui, muiiiito bom!
As sextas recebemos visitas de quem queira nos visitar. É feito um tour pelo lugar, contamos um pouco da história, vemos um filme (assisti a Rudolf Stein parte 1, vou perder a parte 2, infelizmente) e jantamos.

Início do tour pela Sadhana
Sábados e domingos são bastantes livres, temos em geral apenas uma Seva. Todo mundo aluga uma motinho e saímos, as vezes juntos, as vezes separados, para cuidar da nossa vida.

Não querendo ficar de fora, também aluguei uma. Não é bem uma moto, pois não tem marcha. Eles chamam aqui de scooter. O cara que aluga é super tranquilo, me alugou mesmo eu não sabendo dirigir, e ainda me ensinou como fazer, hahahahahahahaha.

O primeiro dia fiquei somente por aqui, treinando, indo e vindo, até pegar um pouco de segurança para me aventurar mais além. Hoje já vou e volto de Auroville, o que me trouxe muita independência, mas não me aventuraria pelas cidades, permaneço apenas nos vilarejos. O maior obstáculo aqui são as vacas, que decidem simplesmente atravessar as ruas, sem aviso prévio e nem mesmo uma buzinadinha!



Sim.... passei eu também a buzinar ruas afora. E percebi que eles buzinam não para que o outro saia da frente, mas para sinalizar que estão passando. É assim que se mantém seguros e fluindo.

Mas ando devagarzinho, um pouco mais rápido que uma bike apenas. Se combinamos de ir a algum lugar eu tenho que sair 15 minutos antes da galera, pois vou assim, tranquilinha, devagar, focada e... segura.

Outra coisa legal que dá para fazer aqui é mergulhar no lago de lama. No começo fiquei meio assim, tipo...lama? Mas é bem gostoso, geladinho, refrescante e, de quebra, faz bem para a pele.

Mud Pool, refrescante.
E assim, entre trabalho e lazer, meditação e Ioga, passei duas semanas muito legais por aqui. Quem quiser conhecer mais sobre este projeto, é só clicar aqui SADHANA FOREST

Quarta feira parto para uma estadia de 4 dias em um Ashram, fazendo o que quer que seja que as pessoas fazem em um Ashram, aí conto para vocês.

E para não perder o hábito, uma foto das minhas crianças da Mammadu, se divertindo no boliche


Um beijo e até!

sábado, 15 de agosto de 2015

Índia: Tradições e Contradições

Bom dia pessoal, greetings daqui da Índia!

Detalhe do templo Valleeswarar
Bom.......por onde começar? Segunda feira passada cheguei por aqui. Apesar de brifada sobre os indianos, através de um excelente livro, presente de meu amigo Renato, nada poderia ter me preparado para Chennai. Nada.

É uma grande cidade, antigamente chamada de Madras (que particularmente acho mais charmoso), com mais de 8 milhões de habitantes e a capital do estado de Tamil Nadu.

Foto Google

A Índia varia enormemente em cultura, hábitos, vestimentas e línguas entre um estado e outro, assim tudo o que eu vou relatar aqui é baseado apenas neste pedacinho da Índia, embora algumas coisas possam ser generalizadas.

Como toda cidade grande da Índia, Chennai é caótica. Juro, a gente fala de São Paulo, mas SP é o paraíso na terra comparado com Chennai. 

O transito é algo sem explicação. Eles encaram as regras de transito muito mais como uma sugestão do que deve ser feito do que uma regra em si, de maneira que sua interpretação é bastante flexível. Quer para no meio da rua para o garupa descer da moto? Tudo bem. Quer fazer uma conversão proibida? Tudo bem. Uma entradinha básica na contra mão? Tudo bem também.

Foto Google
O resto nem se altera, desvia e segue caminho, tão acostumados que estão.

Sim, porque todosestão nas ruas, afinal não existem calçadas transitáveis, e, quando existem, estão tomadas pelos vendedores de tudo que você possa imaginar.


Foto Google
E acima de todos: as vacas. As famosas sagradas vacas indianas que andam por onde querem na hora que querem e como dá um azar danado matar uma vaca, todos desviam prontamente das ilustres figuras, mesmo se elas desejaram dar um role nas rodovias.


Foto Google
Assim, todo mundo andando na rua, numa louca coreografia que, de alguma forma, da certo, flui e todo mundo chega onde quer.

O transito louco é alimentado por uma mania que me disseram ser  nacional: a buzina. Eles buzinam o tempo todo, por qualquer motivo. E se passam 5 segundos sem que alguém tenha buzinado, um vai buzinar somente para não perder o hábito. 

Não que buzinar sirva para qualquer coisa. Todo mundo, as vacas inclusive, mantém o mesmo ritmo e direção que estavam antes da buzina, aparentemente inalteráveis. Mas a buzina é uma música constante e um tanto irritante, ao menos para mim (sempre achei que tenho ouvidos mais sensíveis que o normal).

Capacete é um objeto que acho que não existe por aqui. As motos e bikes viajam no estilo livre. Aliás, e comum ver motos carregando 4, as vezes 5 pessoas, todas sem capacetes, ziguezagueando pelo ensandecido transito.

Foto google
Esta eu tirei depois que o pai deixou a esposa no ponto de ônibus. Detalhe: a menininha, de não mais de 3 anos, escalou sozinha a moto, sem ajuda, e saíram por aí felizes da vida.

Cena ocorrida em Mahabalipuram
O ar é super poluído, mas raramente se ve pessoas usando aquelas máscaras que os chineses costumam andar. Eu ganhei uma tossezinha na garganta, acho que deve ser efeito da poluição...

Eles são limpinhos nas suas casas e comércio, sempre varrendo com uma vassourinha bem típica daqui

Foto Google

Cuidam bastante da higiene pessoal, raramente se vê alguém com roupa suja, ou despenteado, com barba por fazer, são muito vaidosos.

Mas a noção de limpeza pública inexiste. As calçadas são imundas. Jogam tudo na rua o tempo todo e como, até onde eu tenha visto, coleta de lixo também não existe constantemente, fica tudo pelas ruas mesmo, numa sujeira danada.


As ruas que vendem produtos perecíveis, como comida, são as piores, pois os restos ficam se acumulando e acumulando e deteriorado, e o cheiro insuportável. Me admira não ver ratos e mais ratos andando pela cidade. 

Somado a isto, os odores dos restaurantes e preparadores de comida, com seus fortes temperos, fazendo o ar ser uma combinação de cheiros muito peculiar, dificilmente ignorado.

Coloque nisto tudo um calor de 40 graus, uma umidade altíssima, que te faz suar em bicas o tempo todo e tem-se um quadro inicial chocante.

Foi assim que me senti: em estado de choque.

Poucas ruas são largas, a maior parte é estreita. É como se fosse um imenso largo 13, mas lotado de pequenas lojas (tem 4 metros quadrado, em média).

Rua de Chennai
Tudo dá a impressão de ser inacabado. Não sei se eles começam e depois desistem, ou se é assim mesmo que é para ser, mas a impressão que se tem é que tudo fica pela metade, sem acabamento, meio relaxado.

Os restaurantes, cafés, lojas, clínicas médicas, tudo é meio descascado, não te chamado para entrar. Eu queria uma massagem, mas depois de ver o lugar, acabei desistindo. Para nossos costumes, parece não inspirar confiança.

Acho que somos um povo que compra o livro pela capa, e eles não. Seguramente acabarei me acostumando e ignorando este (in) acabamento. Tudo sempre é uma questão de trocar a lente com a qual se vê o mundo.

Eles tem templos em tudo quanto é lugar, sendo um povo bastante religioso. E para garantir que no seu caminho você não ficará sem um templo, existem estes mini templos espalhados quase que em cada esquina. Você está indo ou vindo de algum lugar, para num ambulante vendendo flores e faz sua oferta. Tudo muito prático.

Mini Templo na rua de Chennai

Chennai tem um bonito templo, que gostei muito de conhecer: Valleeswarar. Como a maioria dos templos daqui tem um enorme "teto", cheio de detalhes sobre os deuses e demonios.


Foto google, a minha tava escura

Tem diversas estatuetas representando os deuses pelo templo e, claro com todas as devidas proporções, me lembraram os nossos santos e orixás:

detalhe do templo

Tem diversas religiões espalhadas pela India, mas aqui em Tamil Nadu a mais forte é o hinduísmo e gostam muito de Shiva, Parvati e Ganesha.

Devotas
Não é possível converter-se em hindu, se nasce hindu, e acho que somente assim para se entender tão complexa religião, com tantos deuses e tradições. Os templos são relativamente simples (lembro-me que na Tailandia eram mais imponentes), mas coloridos e ricos em detalhes.

Devoto
Na cidade de Mahabalipuram os templos datam do século VII e foram escavados em pedra, num trabalho lindo demais. Todo o conjunto de templos e monumentos foi declarado patrimônio da humanidade pela UNESCO

Foto google

Detalhe do templo
conjunto de templos
A erosão está levando os detalhes embora, e com o tempo tendem a desaparecer, ensinando a todos a impermanência desta vida, e a necessidade de não apego. Tudo passa, tudo acaba.

Esta é uma cidade pequena e um paraíso, se comparada a Chennai. Menos pessoas, menos transito, menos tudo. 

É uma cidade de pescadores, e isto se reflete na praia

vista da pousadinha
De manhã e de noite dá para ver os barquinhos indo e voltando da pesca diária.

Tive a sorte de estar nesta cidade durante um período sagrado e acompanhar as pujas, oferendas feitas aos Deuses. Infelizmente o interior do templo, onde as pujas ocorriam, eram somente para os hindus e não pude ver, mas aqui uma foto google de como é uma oferenda:

Puja
A cidade se enfeitou toda, com flores e luzinhas, e foi muito bonito de ver.

A Índia te demanda um alto poder de adaptação, e rápido. Seus odores, barulhos, sabores e tradições te exigem ao máximo, e você tem que, a cada momento, decidir se isto irá te irritar e te tirar do sério ou não. Se decidir que sim, você poderá passar o tempo todo tendo pitis 

Por exemplo, eles raramente conseguem responder de forma específica a uma pergunta específica. Eles tem um jeito peculiar de mexer a cabeça que não é o nosso sim nem o nosso não, mas um meneio meio arredondado que é bastante gracioso, mas que quando você precisa de uma resposta definitiva e te dão este meneio, você meio que fica sem resposta. Depois de um tempo você acaba percebendo que, na maioria das vezes, este meneio significa positivo, mas cada caso é um caso....

Outro hábito: Você pergunta onde é tal lugar e eles fazem um vago gesto com o braço indicando “ali na frente”, mas não a direção exata da coisa. E como eles nunca dizem que não sabem algo, este gesto da mão não é 100% confiável, e as vezes você pode levar muito tempo para achar o que busca, seja uma rua, o ônibus que deve tomar, um restaurante.....

Os horários dos ônibus também são aproximados. Por exemplo, de Chennai para Mahabalipuram, a única informação existente é que o ônibus passa de 1 em 1 hora, mas não a hora em si. Ou seja, pode ser que você fique 1 hora esperando o próximo (se ele não se atrasar), no sol quente, suando em bicas.

Tudo é um exercício de paciência e de manter a calma interior no caos exterior. A Índia é curso avançado de desenvolvimento espiritual :-)

A comida é algo que estou provando aos poucos, pois é bem forte, e não quero dar (mais) um choque ao meu organismo. Já provei coisas muito boas (Samosa, Mosa, Idly) e tudo é comido (e servido) com a mão, Outra adaptação.

Mas em geral, com este calor todo, não sinto fome durante o dia, comendo somente de manhã e a noite. Acho que já perdi os sorvetes que comi na Itália.

Mas se você entra na onda deles, e aprende a ignorar estas coisas e não se deixar abalar (como eles não se deixam), verá que é um povo interessante, simpático, sorridente, atencioso, enrolado e bastante curioso.

Foto google
Te perguntam de tudo: de onde você é, porque está aqui, se está gostando, qual comida você mais gosta, no que trabalha, se é solteira etc. No meu caso devo causar uma confusão na cabeça deles: mulher viajando sozinha.

Isto não existe entre os indianos que viajam sempre em bando. Eles fazem muito turismo no próprio país, mas mulher viajando desacompanhada? Nunca!

Com isto ando bastante atenta nas ruas e tento me expor o menos possível. Roupas largas e compridas (o que me mata de calor). É difícil achar o balanço entre manter-se alerta e ao mesmo tempo aberta ao convívio e a descobertas. Pois também se eu não falar com ninguém (e são somente os homens que falam com você) perco a oportunidade de me relacionar e conhecer um pouco mais sobre costumes e cultura. Acho que meu balanço ainda é conservador, mas prefiro ir devagar com o andouro e conhecer aos poucos as regras não ditas daqui.

Aqui no sul eles ainda se vestem de maneira bastante tradicional e quase todas as mulheres usam o sari. Me disseram que no norte já não se usa mais estas roupas, apenas em ocasiões especiais, então acho que tive sorte, pois é muito bonito e colorido andar pelas ruas e ver tanta diversidade na maneira de se vestir.

Meninas em sari admirando o mar da baia de Bengala

Aliás o dress code daqui também é uma contradição: não se pode mostrar os ombros ou as pernas, mas a barriga, que mal se esconde num sari, tudo bem. Vai entender...

Bom, para as mulheres, além do sari, é comum ver um tipo de bata usada sobre calça. É bem prático e parece confortável.

foto google

Já os homens usam muita calça comprida e camisas de manga comprida, mas alguns usam esta saia que me parece bastante apropriada para o calor daqui



Em muitos aspectos a India lembra o Brasil, até mesmo na TV. Adoram as novelas e lá a cor das pessoas é quase branca, enquanto nas ruas todo mundo é marrom escuro. Lá falam Hindi, mas aqui fala-se Tamul. O ideal de beleza é magro e claro, mas nas ruas são gordinhos e escuros.

A índia é um país de tradições e contradições, moderna e antiga, tecnologia e atraso, que te surpreende a todo o momento.

Dizem que ou você ama ou odeia e que leva de 2 a 3 semanas para você finalmente perceber em que extremo está. Acho que é o tempo de acostumar-se com o choque inicial e abrir-se para a beleza que existe, permitindo-se ver outro mundo, outros hábitos, outro tudo.

Eu ainda não amo a Índia, mas estou me acostumando, ainda apenas arranhando a superfície de tão complexo país. Acho que na verdade nunca se compreende a Índia, a menos que seja indiano. 

Estou agora em Podicherry, cidade também costeira, assim como as anteriores, mas de influência francesa, o que deixou uma arquitetura diferente, ao menos na parte mais próxima do mar.

Praia rochosa de Podicherry

O mar daqui é o Bengala Bay (Baía de Bengala), de fortes correntezas e agradável temperatura (embora eu não tenha entrado na água, apenas colocado os pés). O Ganges é um dos rios que desemboca por aqui, assim não sei se é bom entrar no mar ou não, mas acho muito legal estar na Baía de Bengala 

Hoje foi a celebração da independência, e as ruas estavam lotadas de gente, todas felizes, celebrando. Fiquei vagabundeando por aí, absorvendo a energia positiva que emanava delas.

E como não poderia deixar de ser uma foto de uma estátua de Gandhi.



Semana que vem vou para Auroville, onde ficarei trabalhando por um tempo. Não sei se terei internet lá, então, quando der, conto como foi. 

Desculpe o grande do texto, mas a Índia não pode ser resumida em poucas palavras.

Beijos,